sábado, 8 de setembro de 2012

Crisálida

Há um mundo lá fora, e eu sei disso porque ouço vozes. Elas ondulam e estremecem meu asilo, arrancando-me arfadas de terror. Nos meus piores pesadelos sou vomitado e, cercado delas, obrigado a viver o que é a mim incompreensível. Tenho medo do que é novo e tenho medo de viver o que não consigo significar. Queria ao menos ter o conforto de fingir que entendo meu mundo para manter minha cabeça emersa sobre minha desorganização profunda.

Gosto de imaginar que quando minha hora por fim chegar, uma mão desconhecida e cálida me guiará para um destino que aceitarei com horror. E a partir daí o horror será minha única companhia, meu intérprete das vozes ininteligíveis que nunca se calam. Não, não são as origens das vozes que me assombram, mas sim o que elas tem a me dizer. Pessoas em si jamais me causarão receio. O que me interessa é o néctar que elas possuem, são seus interiores e essências dos quais quero me alimentar e colecionar, assim como um degustador carrega sua sina infinita de avaliar sabores.

Alguém? Você pode me ouvir? Consegue escutar o bater mudo das minhas asas que mal causam uma aragem na minha clausura?  Então dá-me a tua mão. Dá-me a tua mão e deixe-me segurá-la até que essa metamorfose esteja completa e as vozes se transformem em rostos, o desconhecido se converta em familiar, brisas sejam furacões e eu consiga – enfim – voar.